Fui ao Carmo realizar uns afazeres e acabei encontrando umas amigas que me lembraram que hoje era a palestra de Pilar Del Rio, a grande companheira do grande escritor Saramago. [...] Quando a palestra dela terminou, saí da tenda em busca de uma entrada lateral para ver se conseguia falar com ela, só que não achei nada. Resolvi voltar para a tenda para ver se ela ainda estaria por lá e foi quando vi um grande circulo em volta de alguém, logo pensei que fosse ela e fui ao encontro do aglomerado. Perdão a expressão, mas quando vi quem era... Quase não acreditei!
O
aglomerado se deu por conta de uma entrevista, creio que ao vivo, de Eduardo
Campos para a PIG[1]. Não sabia ainda o que, mas sabia que tinha que
questiona-lo sobre tudo isso que esta acontecendo com quem vai às ruas. [...]
Eu, por mera coincidência, estava com a camisa do Passe Livre e quando lembrei
disso usei para me apresentar. Foi basicamente o seguinte: Toquei em suas
costas e ele se virou automaticamente, nós dois estávamos com um grande sorriso
e nos cumprimentamos com o velho aperto de mãos e comecei o dialogo:
-
Boa noite, senhor governador!
-
Boa noite!
-
Faço parte do movimento Passe Livre, estou indo à rua por sua luta.
-
Que ótimo! Eu também fui muito à rua!
-
Senhor governador, o senhor tem conhecimento da criminosa repressão policial
que esta acontecendo contra os movimentos sociais?
Um
momento de silêncio e uma 'engolida seca' depois:
-
Não, eu não tenho! Você faz parte de que partido?
-
Não sou de partido, faço parte Frente Independente Popular que vai à rua em
nome dos anseios do povo. Se o senhor quiser ganhar consciência sobre o que
suas ordens fazem conosco, eu o estou a convidar para uma plenária nossa. Quem
sabe assim você saiba o que acontece de fato na rua!
-
Ah, mas nós já fazemos muitas reuniões. E tem certeza que não faz parte de
partido?!
Sendo
nojentamente irônico, falou algo como se devesse conhecer o partido dele.
Enfim, voltando:
-
Falo sério, governador! Faço parte de uma juventude que contesta essa
representação política e se caracteriza cada vez mais como apartidária.
Desviando
o olhar e tentando sair de perto de mim, ele retrucou:
-
Isso não existe! É bobagem!
-
Errado, governador, existe e cresce!
Por
algum motivo - estava nervosa- citei alguma analise de Bauman, um sociólogo
polonês que gosto muito e que faz uma analise brilhante dessa característica.
De forma irônica, perguntei se ele conhecia!
-
Sim, conheço! E você...
Ele
perguntou se conhecia alguns pensadores, o que certamente creio que esperava
ouvir uma resposta negativa e sair de esperto, só que ele não contava que eu
realmente conhecesse todos. Aí os seguranças e as pessoas que estavam a sua
volta o tiraram de lá.
Ps. Nosso belo encontro aconteceu após uma entrevista dada, então a mídia que estava por lá registrou o momento quando notou do que se tratava. Não sei como poderão usar as imagens, mas ressalto que não dei entrevista a ninguém. Depois das palavras trocadas com o Coronel [Eduardo Campos], ainda estava com esperança de encontrar a Pilar e passei mais um tempo por lá. Ela não voltou, então fui embora.
- Mylena Cristina
Notas:
[1]
- PIG é uma sigla referente ao termo satírico "Partido da Imprensa
Golpista".