Todos
pensam que a revolução cubana acabou quando as guerrilhas revolucionárias
tiveram seu fim e o velho Estado burguês de Cuba caiu. É verdade, uma
batalha se tinha ganhado, mas a guerra contra a burguesia até hoje, não está
perto de chegar a um fim. Talvez
com esse pensamento que Che escreveu este texto, onde faz uma crítica à grande
parte dos movimentos progressistas da América Latina:
Pode-se discutir longamente a questão de saber se a tática
deve ser a ação guerrilheira ou se é possível realizar outras ações como eixo
central da luta. Nossa convicção de que a ação guerrilheira deve ser o eixo
central na América se baseia em dois argumentos:
Primeiro:
se levarmos em consideração o fato de que o inimigo lutará para manter-se no
poder, devemos pensar na destruição do exército opressor, e para isso opor-lhe
um exército popular. Esse exército não nasce espontaneamente, deve armar-se com
o material pertencente a seu inimigo, o que implica uma luta dura e permanente
na qual as forças populares e seus dirigentes ficam expostos ao ataque de
forças superiores sem terem condições razoáveis de defesa ou manobra. Em
contrapartida, o núcleo guerrilheiro situado em terreno de luta favorável
garante a segurança e a permanência do comando revolucionário, e as forças
urbanas, dirigidas a partir do estado-maior do Exército do Povo, podem realizar
ações de capital importância.
Segundo:
o caráter continental da luta. Poder-se-ia conceber esta nova etapa da
emancipação da América como o confronto de duas forças sociais lutando pelo
poder num território dado? Evidentemente não. A luta causaria a morte de todas
as forças populares e de todas as forças repressivas. Os ianques intervirão por
solidariedade de interesses e porque a luta na América é decisiva. Eles o farão
com todas as suas forças, castigarão as forças populares com todas as armas de
destruição a seu alcance. Não deixarão que o poder revolucionário se consolide.
E, se por acaso isso acontecer, voltarão a atacar, não o reconhecerão, tentarão
dividir as forças revolucionárias, introduzindo todo tipo de sabotadores, e
tentarão afogar economicamente o novo Estado, aniquilá-lo em outras palavras.
Em
função desse panorama, consideramos difícil que se chegue à vitória num só
país. À união das forças repressivas, devemos responder com a união das forças
populares. Em todos os países em que a situação de opressão chegar a um ponto
insustentável, devemos erguer a bandeira da rebelião, e esta bandeira terá, por
necessidade histórica, um caráter continental. A Cordilheira dos Andes se
tornará a Sierra Maestra da América como disse Fidel, e todos os imensos
territórios que compõem este continente serão o cenário da luta mortal contra o
poder imperialista.
Não
podemos dizer quando esta luta adquirirá este caráter continental, nem quanto
tempo durará, mas podemos prever seu advento, porque ela é filha de
circunstâncias históricas, econômicas e políticas e por isso não poderá se
desviar do seu rumo.
Ernesto 'Che' Guevara |
Porque
tais atitudes? Porque essa dilapidação das energias populares? Por uma única
razão. No seio das forças progressistas de alguns países da América, existe uma
confusão terrível entre objetivos táticos e estratégicos. Temos de reconhecer a
inteligência da reação, que conseguiu fazer destras posições ofensivas mínimas
o objetivo fundamental de seu inimigo de classe.
Nos
países onde esses erros tão graves são cometidos, o povo mobiliza suas legiões,
ano após ano, para conquistas que lhe custam imensos sacrifícios e que não tem
o mínimo valor. São apenas pequenas colinas dominadas pelo fogo cerrado da
artilharia inimiga. O nome delas são parlamento, legalidade, greve econômica
legal, reivindicações por aumento salarial, Constituição burguesa,
libertação de algum herói popular. E o pior de tudo é que para ganhar estas
posições tem de intervir no jogo político do Estado burguês e, para obter a
autorização de entrar neste jogo perigoso, é preciso demonstrar que aturará
dentro dos estritos limites da legalidade, que é bonzinho, que não representa
perigo, que não passará pela cabeça de ninguém assaltar casernas ou trens, nem
destruir pontes, nem punir os carrascos e os torturadores, nem ir até as
montanhas e erguer com o punho forte e definitivo a única e violenta afirmação
da América: a luta final por sua redenção.
— Ernesto 'Che' Guevara — [Texto
retirado do livro "Che Guevara - Política" da editora Expressão Popular]