terça-feira, 31 de dezembro de 2013

O povo como "receptor passivo" e a máquina de propaganda "stalinista" como "emissor todo-poderoso"

Há pouco tempo, me deparei com um debate que não ousei comentar. Girava em torno de questões como culto a personalidade e o “stalinismo”. O debate começou com declarações de total rechaço à figura de Stálin, proferidas por um trotkista jovem. E do debate ali efetuado, veio um aglomerado de inverdades, e de raciocínios errados em torno desta questão, que seria o “stalinismo” e o culto a personalidade para com a figura de Stálin.

Ainda que utilizando este debate como norteador, ele não representa a única vez que trotkistas (ou anti-stalinistas em geral) reproduzem tais linhas de raciocínio errôneas. Esse texto tem por função apenas de organizar argumentos e fatos que desmentem certas linhas de raciocínio proferidas por certos anti-stalinistas.



Vários marxistas-leninistas, defensores do legado de Lênin e de Stálin, reconhecem que houve uma forte máquina de propaganda política em torno de líderes revolucionários, que reforçavam a admiração que o povo soviético já os tinha por eles. Isso é fato, tanto para Lênin quanto para Stálin. No entanto, essa admiração (ou mesmo o culto à personalidade, se preferirem) que ocorreu na URSS, resistiu por anos, e ainda resiste na Rússia, mesmo depois de décadas da morte de Stálin e Lênin. Lênin é tão querido entre o povo russo, que numa pesquisa sobre aprovação percentual, ainda, após praticamente 90 anos, teve 55% de aprovação. Stalin logo atrás, na mesma pesquisa percentual, teve 50% de aprovação. Uma quantidade significativa. [1]




A explicação comumente usada por anti-stalinistas é a de que “independente do resquício de admiração a Stálin, que o povo russo tem do mesmo, isso não provaria que a gestão de Stálin foi correta e positiva”. Alegam que isso não prova que Stálin não foi um “genocida fascinora”, “ditador burocrata”, nem “todo poderoso” da União Soviética. O discurso normalmente utilizado por anti-stalinistas para alagarem tal afirmação gira em torno de frases como: “A máquina de propaganda do Partido Comunista soviético sob a gestão de Stálin empreendeu uma imposição de culto à personalidade tão forte, mas tão forte, que faz com que o povo soviético até hoje tenha resquícios das tais práticas de “impor adoração” ao ditador Josef Stálin”. Para muitos anti-stalinistas essa afirmação é suficiente para utilizada como um verdade.



Anti-stalinistas (normalmente os declaradamente de direita, mas alguns “de esquerda” também), costumam fazer equiparações das figuras de Stalin e Hitler: “Stálin e Hitler foram igualmente ditadores e genocidas, inclusive Stálin matou mais do que Hitler. Tal como Hitler foi prejudicial ao proletariado alemão, Stálin foi prejudicial ao proletariado soviético”. Então pegando um gancho nestas equiparações, o exemplo poderia ser utilizado também para o ditador nazista Adolf Hitler, afinal, a máquina de propaganda nazista era muito mais forte do que a máquina de propaganda soviética.



O culto à personalidade era instituído de forma agressiva na sociedade alemã. Mas e se falarmos: “A forte adoração que se tem a Hitler entre o povo alemão nos dias de hoje, é resquício da forte máquina de propaganda nazista, que impôs tão fortemente a adoração à Hitler, que até hoje, boa parte do povo alemão, o admira”... Essa afirmação pode ser feita, mas ela não se baseará numa verdade. Por quê? Pois, bem, o fato é que comprovadamente, uma parte considerável do povo russo nos dias de hoje, ainda admira Stálin (50%, para ser mais exato), e isso são afirmações de fontes confiáveis (Instituto Levada Center, de Moscou, que realizou a pesquisa/estatística de maneira plenamente imparcial) [2]. Diferentemente, Hitler é rechaçado pesadamente pelo povo alemão. Defender o nazismo ou Hitler nos dias de hoje, mesmo que de maneira discreta e/ou “enrustida”, é motivo para você perder certo crédito com a sociedade. Se você concorda comigo nisso, mas é um dos tipos que tenta equiparar Stálin à Hitler, você se encontra numa equação com uma incógnita sem resposta.



Mas é fácil desconstruir e refutar tal linha de raciocínio. O problema não é a “incógnita da equação”, o problema é que o anti-stalinista caricato “formula a equação” de maneira errada.



Os anti-stalinistas de direita, e até os “de esquerda”, desconsideram inúmeros fatores para se aprofundarem neste tema. Os primeiros fatos que eles desconsideram é: 1) O povo não é um receptor de informações passivo plenamente ludibriável, 2) a máquina de propaganda soviética não tem superpoderes, nem poderes atemporais, 3) e nem os dois juntos. Os outros fatores que desconsideram são: 1) contrapropaganda à Stálin, ou a pesada propaganda anti-stalinista.





O povo como receptor passivo, e a “propaganda stalinista toda poderosa” [3]



O que seria isso? Vou explicar. Por esta linha de raciocínio: que considera que o povo russo só tem esse alto índice de admiração à Stalin por conta da máquina de propaganda do Partido Comunista da época de Stálin, ela acaba reforçando a inverdade de que os povos são receptores passivos de qualquer propaganda político-ideológica.



Esse tipo de alegação sustenta afirmações como a de que: “A propaganda falou, o povo escutou. O povo é um recptor passivo que é moldado por um emissor todo poderoso. O que o emissor diz, o povo absorve e pronto”.



Vou expor o problema deste tipo de inverdade: De fato, na relação de propaganda e povo, o povo de fato é um receptor de informações de ideologia disseminada pela propaganda. O problema é que o “receptor” digere a informação de diversas maneiras e tem sua própria experiência da realidade. Exemplo: Se a comida está horrível, é complicado esperar que o povo, que consome tal comida, vá aceitar a propaganda como a realidade, porque o povo vai contrapor as duas coisas (a realidade que ele experimentou e a propaganda que ele assimilou).



É só ver através da história o fracasso e o desgaste inútil de certas tentativas de doutrinação, especialmente no caso de ocupações estrangeiras. Podemos citar o caso da colonização do continente americano por parte dos Europeus. Índios que mais foram dizimados do que convertidos às concepções ideológicas e culturais do homem branco europeu da época.



Essa mentalidade dualista, funcionalista, que muitos anti-stalinistas tem (incluso aqui os “de esquerda”, incluindo vários trotkistas) que alegam que: “O povo russo admira o legado de Stálin, não por saldo positivo, mas porque eles receberam uma “educação stalinista” e “doutrinação anti-trotkista”.” Isso abre precedente para afirmar que o povo russo só admira Stálin, e com ele seu legado, porque não conhece “a palavra do seu “salvador”, Trotsky”. Independente disso, como já foi aqui exposto, o povo não é uma massa totalmente moldável. Há alguma razão concreta (que não a propaganda) para a memória de Stálin ser um tanto positiva, se não ela já teria sido corroída, e toda sua popularidade estaria na lama (e não com um saldo tão considerável como está hoje).





Outro fator que anti-stalinistas desconsideram: A propaganda anti-stalinista!



Bom, no que concerne a afirmação de que “a popularidade de Stálin se mantém só porque a propaganda stalinista foi muito pesada” (como se a propaganda nazista fosse bem leve), eu acabei de apresentar argumentos na sessão anterior do texto, desconstruindo esse funcionalismo que prega que o povo é um receptor passivo, e a propaganda um emissor todo poderoso. Mas há outros pontos que podem derrubar as intenções de afirmações como essa, de que “Stalin só é popular nos dias de hoje, por conta da propaganda stalinista de outrora”. A outra questão que vou apresentar agora é mais fácil ainda de compreender.



Se os anti-stalinistas alegam tanto o poder grandioso ao emissor ideológico, a propaganda política e etc., porque o inverso, por eles, não é considerado?



Se a propaganda, o “emissor”, é tão poderoso assim, ele pode ser igualmente poderoso no que concerne a propaganda negativa. Como já falei anteriormente, a propaganda não tem o poder de nos forçar a acreditar em algo contrário da realidade (apesar de nos tentar empurrar para tal em muitas situações). Então já não parto dessa linha de pensamento. Mas se a propaganda tem algum poder de prestigiar a imagem de algo, ela tem o mesmo de desprestigiar; inclusive de líderes revolucionários. E se houve propaganda política em prol de Stálin, houve mais ainda em prol de que sua imagem fosse colocada por água abaixo. E não houve propaganda negativa de Stálin apenas na Rússia, havia no mundo como um todo.



Se a propaganda partidária da URSS sob a gestão de Stálin é critério para deslegitimar a balanço positivo que o povo russo atribui à Stálin, porque a propaganda anti-stalinista que foi efetuada não é usada para deslegitimar a “má fama” que Stálin tem no mundo ocidental. E ainda digo mais, porque a propaganda anti-stalinista que foi efetuada na Rússia não é utilizada pelos anti-stalinistas para afirmarem coisas como: “mesmo com a forte propaganda contra Stálin e contra seu legado, a sua popularidade ainda permanece considerável após décadas, gerações e anos de doutrinação anti-stalinista”? Porque não é conveniente a historiografia burguesa, e nem é conveniente aos ditos “de esquerda” que com ela fazem coro.



As provas das colossais propagandas que buscam difamar o legado de Stálin e sua figura como líder revolucionário e renomado estadista, não são poucas.



As mesmas pessoas que falam em “educação política anti-trotkista” ou “doutrinação política stalinista” para tentar deslegitimar a popularidade de Stálin que ainda resiste hoje, corriqueiramente são as mesmas pessoas que desconsideram outros “processos de educação política”. Não podemos esquecer de que quando Krushev assumiu a direção da URSS após a morte de Stálin, o mesmo iniciou um processo de propaganda anti-stalinista agressivo, e em muito baseado em inverdades.



A partir daí começa o processo de “desestalinização” da URSS e do Partido Comunista. A ofensiva anti-stalinista foi tão pesada, que tal pauta de “desestalinização” foi decretada para todos os Partidos Comunistas (no mundo) daquela época que tinham mínimas relações com o PC(b)US - Partido Comunista (Bolchevique) da União Soviética. O PCB (na época Partido Comunista do Brasil) foi um deles (e até hoje o partido é indiretamente afetado por fatos históricos do passado). Nesse processo de “desestalinização” na URSS, não só teses de partido e discursos baseados em inverdades eram utilizados, mas também difamações públicas à Stálin.



Historicamente, podemos perceber que a partir da gestão de Krushev começa o declínio do socialismo, da economia planificada, do partido enquanto vanguarda do povo e etc., na União Soviética. Mas a dissolução de fato da URSS se deu muito mais tarde. E com esta dissolução – oficial – da primeira nação socialista, vem com ela um forte massacre da memória comunista. E isso tudo, junto com a repressão ao povo russo nas ruas, porque se opunham a restauração capitalista [4].



Na Rússia, inúmeras faculdades de história foram fechadas por alguns anos, e o curso acabou por passar por uma reformulação. Os cursos de história passaram a ser reorganizados pela Igreja Ortodoxa. Com isso, começaram a se implementar aulas que eram praticamente “aulas de anticomunismo/anti-stalinismo” [5]. Além disso, boa parte dos jovens destes cursos foram frequentadores da escola dominical.





A incógnita da questão é: o prestigio de Stálin tem como base, não a pura e simples propaganda, mas sim os seus reais méritos!



Considerando tais fatos, podemos entender que há uma razão concreta e material para que e popularidade de Stálin ainda permaneça como está. O fato de Stálin ter seu legado lembrado como algo positivo por uma parte considerável do povo russo, não é por conta da pura e simples propaganda, mas por conta de seus reais feitos e méritos para a construção do socialismo na URSS, e em apoio aos revolucionários de todo o mundo. Se Stálin fosse o demônio vermelho que os anti-stalinistas tanto pintam, não haveria propaganda que segurasse.



Inclusive, considerando que segundo as pesquisas do Instituto Levada Center, que colocou Stálin com um índice de 50% (Lênin ficou com 55%) de aprovação do povo russo, devemos considerar toda a propaganda anticomunista/anti-stalinista que prevaleceu após a restauração capitalista na Rússia. Afinal, se não fossem as difamações anticomunistas efetuada pelos que dirigiram a restauração capitalista na Rússia, a popularidade de Stálin estaria maior ainda.



Devemos considerar que no que concerne a Stálin, seu prestigio passa por mais provações até mesmo que Lênin, devido ao fato de que Lênin apesar de ser visto maus olhos em setores da esquerda (comumente a “esquerda libertária”), Stálin é o maior alvo de críticas de além da “esquerda libertária”, é alvo dos revisionistas, dos marxistas mais academicistas e dogmáticos, e dos trotkistas. Além é claro de ter sido maior alvo das ofensivas da direita política, sobretudo na época da Guerra Fria.



Em defesa do Marxismo-Leninismo: viva o legado de Josef Stálin!

Abaixo o oportunismo de esquerda e direita, e o coro com a historiografia burguesa!

Stálin vive!








Notas:






[2] – Idem.



[3] – Esta seção e a próxima, deste texto, são em sua maior parte, argumentos e conteúdo oriundos do debate tratado com alguns anti-stalinistas no grupo de debates do VàE. Informações e contribuições colocadas em comentários por André Drumond Ortega, Pedro Marin, e colocações minhas.






[5] – O termo anti-stalinismo é muito citado no texto. Ainda que se tenha uma ênfase particular na difamação à Stálin, o anti-stalinismo é intrinsecamente ligada ao anticomunismo, e não são coisas totalmente dissociadas, embora certas correntes “de esquerda” tentem alegar que não.